quinta-feira, 24 de março de 2016

Carta à Presidente do Conselho Executivo da Escola BI de Angra do Heroísmo


Exma. Senhora

Dr.ª Nélia Rebelo
Presidente do Conselho Executivo
da Escola Básica Integrada de Angra do Heroísmo

c/c à senhora Diretora Regional da Educação, ao senhor Secretário Regional da Educação e Cultura e ao senhor Presidente do Governo Regional dos Açores

Recebi na minha caixa de correio um apelo para que enviasse, a V. Exª, um e-mail a contestar a integração de uma conferência intitulada a “A importância da festa Brava na ilha Terceira” no programa da XIV Semana da Ciência, promovida pelo Departamento de Ciências da EBI de Angra do Heroísmo.

Embora esteja convencido de que se tratará de uma perda de tempo da minha parte já que a mesma terá tido a concordância do Conselho Pedagógico da Escola e da prórpia Secretaria Regional da Educação que era uma das entidades que terá estado presente na sessão de abertura da referida semana, venho manifestar a minha estranheza e indignação pela presença de uma conhecida ganadeira que como todos sabemos aluga e vende touros para touradas à corda e de praça.

O conhecido pedagogo francês Freinet, sobre a educação escreveu que o principal fim “é o crescimento pessoal e social do indivíduo, elevar a criança a um máximo de humanidade preparando-a a não apenas para a sociedade atual, mas para uma sociedade melhor, fazendo-a avançar o mais possível em conhecimento num constante desabrochar”.

Pode Vossa excelência não concordar com as ideias e com a pedagogia de Freinet, mas acho que qualquer pessoa de bom senso pode rever-se no fim enunciado. Assim sendo, gostaria que Vossa Exª refletisse sobre que contributo poderá dar a referida conferência para o conhecimento científico das crianças, como pode a divulgação e banalização da tortura mais ou menos suave contribuir para a formação pessoal de uma criança e, por último, como pode a mesma contribuir para a formação de pessoas mais humanas numa sociedade futura que queremos melhor, isto é onde haja respeito por todos os seres vivos que com os humanos partilham a vida na terra.
Com os melhores cumprimentos

Teófilo José Soares de Braga

quarta-feira, 23 de março de 2016

À Procura do Movimento da Escola Moderna


À Procura do Movimento da Escola Moderna

Nos primeiros anos após a minha profissionalização como professor de Física e de Química, que ocorreu, em 1979, com a conclusão do meu estágio pedagógico na Escola Secundária Domingos Rebelo, procurei sempre atualizar-me no que diz respeito à componente científica da profissão, bem como ler tudo o que se publicava sobre as diferentes correntes da pedagogia.

Para além da leitura de textos de vários pedagogos, procurei saber que movimentos pedagógicos existiam em Portugal, o que faziam e se havia alguma delegação ou alguém nos Açores integrado nalgum deles.

A minha tentativa de contatar com alguém do (MEM) Movimento da Escola Moderna só se concretizou trinta anos depois, com a chegada a São Miguel de um “braço” do Núcleo Regional dos Açores, que tem promovido sessões de formação sobre a pedagogia do MEM, aberta a todos os docentes interessados, na Escola Secundária das Laranjeiras.

Para além de participar nas diversas sessões de formação, estou a reler toda a bibliografia que tinha sobre o MEM, nomeadamente sobre as suas origens tanto em França e como noutros países, bem como em Portugal, onde já identifiquei uma colega que fez parte do movimento ainda durante a ditadura do Estado Novo.

Neste texto, procurarei dar a conhecer um pouco sobre o fundador do Movimento, o educador francês Célestin Freinet (1896-1966) que, segundo Roger Gilbert, foi “um homem livre que, em presença duma situação social que não aprova, a tudo recorre para a transformar”.

Célestin Freinet teve uma vida muito atribulada. Com efeito, antes de cursar o magistério foi pastor, combateu na primeira guerra mundial, tendo os seus pulmões sido afetados para o resto da vida, foi preso aquando da segunda guerra mundial e enviado para um campo de concentração alemão, depois de libertado juntou-se à resistência francesa e combateu o nazismo.

Em 1925 filiou-se no Partido Comunista Francês, tendo-se desligado do mesmo na década de 1950 após ter sido acusado por quele de “pensador burguês” por ter colaborado com o governo após o fim da segunda guerra mundial.

No que diz respeito ao ensino, em 1920, foi colocado como professor adjunto numa aldeia onde começou a “ensinar por meios diferentes da lição tradicional”, mais tarde em 1927, fundou a Cooperativa do Ensino Laico que tinha por principal objetivo “fabricar e editar material que seja útil à nossa escolha pedagógica” pois as editoras não se interessavam por editar materiais provenientes de um “pequeno professor primário” que fazia “afirmações inquietantes e pretende regenerar a escola e os educadores”

Em 1933, estando a lecionar em Saint-Paul de Vence, a comunidade local conservadora não aceitou as inovações por ele introduzidas tendo conseguido que fosse exonerado. Freinet não baixou os braços e dois anos depois criou a sua própria escola

Em 1956, liderou uma campanha, que acabou por sair vitoriosa, a exigir o número máximo de 25 alunos por turma.

Em Portugal, resultado da correspondência trocada entre Freinet e Álvaro Viana de Lemos, este no final da década de 20 do século passado introduziu algumas técnicas Freinet na Escola Normal de Coimbra.

Mais tarde, em 1965, surgiu o MEM, a partir de um grupo de trabalho criado no Sindicato Nacional dos Professores que com todas as cautelas, por causa da ditadura, decidiu aderir à FINEM- Federação Internacional dos Movimentos da Escola Moderna, organização criada em 1957.

Ainda sobre os primeiros tempos do MEM em Portugal, no livro “A Pedagogia de Freinet por aqueles que a praticam”, editado em 1976, pela Moraes Editores, pode ler-se uma entrevista a uma das dinamizadoras de uma escola Freinet, situada nos arredores de Lisboa, que funcionou antes de 1974 quase na semiclandestinidade e onde “por ocasião das inspeções era preciso esconder os jornais escolares e fechar à chave o compartimento onde se encontravam as imprensas escolares”.

Teófilo Braga
(Correio dos Açores, 30892, 23 de março de 2016, p.13)

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