sexta-feira, 26 de outubro de 2018

APONTAMENTOS SOBRE PAULO FREIRE


APONTAMENTOS SOBRE PAULO FREIRE

Comecei a ler, recentemente, o último livro de José Pacheco, fundador da Escola da Ponte, que é uma referência em termos de inovação pedagógica, mas que infelizmente é mais conhecida no estrangeiro do que em Portugal.

José Pacheco, no seu livro “Um compromisso ético com a educação” cita, entre os vários autores que o inspiraram, o nome de Paulo Freire (1921-1997) que é considerado como o mais célebre educador brasileiro.

Paulo Freire é um nome que me é familiar desde os finais de 1974 ou no início de 1975 quando alguns militares ligados ao Movimento das Forças Armadas estiveram em Vila Franca do Campo e me ensinaram o que designaram “método de Paulo Freire” para posteriormente o aplicar junto de pessoas que não sabiam ler nem escrever. Tal ocorreu com algum sucesso, pois com algumas sessões realizadas no primeiro andar de um edifício do senhor Alfredo Gago, situado na rua Teófilo de Braga, onde no rés-do-chão existia uma padaria, foi possível ensinar a ler a dois adultos que até então nem conheciam ou conheciam muito mal as letras do alfabeto.

Paulo Freire começou a trabalhar com adultos analfabetos em 1947, tendo sido professor de História e Filosofia da Educação na Universidade do Recife. A partir de 1962 o seu método de ensino começou a ser experimentado e em 1963-64 foi aprovado um plano para que fossem abrangidos, no Brasil, dois milhões de analfabetos.

Em 1964, após um golpe de estado ocorrido no Brasil, Paulo Freire foi preso e teve de se exilar. Mais tarde, o seu método passou a ser aplicado no Chile e no ano 1969-70 foi professor convidado no Centro de Desenvolvimento e Mudança Social de Harvard.

Entre as várias ocupações e cargos que desempenhou, destacamos o de Secretário-Geral do Concelho Mundial das Igrejas.

Da sua vasta obra publicada, destacamos os seguintes livros: “Pedagogia do Oprimido”, “Educação como Prática da Liberdade” e “Uma Educação para a Liberdade”.

De acordo com Paulo Freire, o homem pode ser encarado como pessoa ou como coisa. Se o encararmos como coisa, a educação só pode conduzir a uma cada vez maior domesticação do homem e o ato educativo não é mais do que um ato de depositar conteúdos. Esta visão a que ele chama "conceção bancária" é a que infelizmente ainda predomina ainda nos dias de hoje.

Por outro lado, se o homem é visto como uma pessoa, deixa de ser uma "caixa passiva, que vai sendo preenchida", mas "um corpo consciente, desafiado e respondendo ao desafio", que está aberto ao mundo e atua de modo a transformá-lo.

Nesta segunda conceção chamada por Paulo Freire de humanista está afastada qualquer possibilidade do educador (professor) manipular o educando (aluno) porque nela está subjacente o seguinte: ninguém educa ninguém, ninguém se educa sozinho e todos se educam entre si, mediatizados pelo mundo.

Sobre a tão apregoada neutralidade da educação/ensino, Paulo Freire é de opinião de que tal não passa de um mito. Com efeito, tal como Ivan Illich que considerava que as escolas constituem instrumentos de controlo social, ele defendeu que de forma consciente ou não a atividade dos educadores "desenvolve-se ou para a libertação dos homens- a sua humanização-, ou para a sua domesticação - o domínio sobre eles".

Para terminar este texto, que tem como fonte o último livro da autoria de Paulo Freire referido anteriormente, deixo uma pequena nota sobre o que ele chama de analfabeto político que “é alguém que tem uma perceção ingénua das relações dos homens e do mundo, uma inteligência ingénua da realidade social”. O analfabeto político ou não tem em conta a realidade e considera que o futuro é a repetição do presente ou considera que aquele já está pré-estabelecido. A primeira perceção ele considera reacionária, a segunda ele escreve que “é uma das deformações mecanicistas do pensamento marxista”.

Teófilo Braga
(enviado ao Correio dos Açores 14 de outubro de 2018, não publicado)